sábado, 22 de dezembro de 2012

O Globo: Os muitos palcos da ‘Miss Comédia’ Ingrid Guimarães



Ingrid Guimarães volta aos cinemas na próxima semana
Foto: Daniela Dacorso

Ingrid Guimarães volta aos cinemas na próxima semana Daniela Dacorso
RIO - Toalhas amarelas já trouxeram muita sorte para Ingrid Guimarães. Graças a uma, que nem está mais em seu armário, a atriz de 40 anos arrumou o papel que lhe abriu todas as portas. E isso foi logo na peça-fetiche de todo mundo que tinha menos de 20 anos na década de 1990: “Confissões de adolescente”. Talvez fosse prudente que ela comprasse outra rápido, já que, a partir do dia 28, a atriz estará de volta aos cinemas em “De pernas pro ar 2”. Afinal, a continuação do blockbuster de Roberto Santucci, visto por 3,6 milhões em 2011, é encarada como uma potencial candidata ao posto de comédia mais rentável do país na atualidade. E, bem ou mal, quando chegou ao Rio, vinda de Goiás, onde nasceu, Ingrid descobriu seu dote para transformar episódios inusitados do cotidiano num estopim para o riso relatando o dia em que saiu Leblon afora com um tecido felpudo, amarelo-ovo, amarrado nos cabelos molhados, sem se dar conta dele.
— Todo mundo olhava para mim na rua, e eu pensava: “Nossa, como esses cariocas são calorosos, sorrindo para a gente...” Quando uma mulher num carro olhou para mim e começou a rir, eu me senti ridícula como nunca. Mas fiquei na minha e voltei para casa, sem tirar a toalha, para não entregar o mico e fingir que era moda. Quando fui fazer um curso de interpretação com Domingos Oliveira, contei esse episódio e ganhei um papel em “Confissões...”, que acabou incorporando o caso ao texto da Maria Mariana. E ainda levei do Domingos uma lição para a vida toda: “Você deve fazer das suas histórias o seu mundo” — lembra Ingrid, em cartaz até amanhã no Teatro dos Quatro, na Gávea, com a peça “Razões para ser bonita”, texto do americano Neil LaBute, dirigido por João Fonseca.


‘O bem, o mal, o pecado’
Quem ler a opinião da crítica do GLOBO Barbara Heliodora sobre o desempenho de Ingrid em “Razões para ser bonita” no texto aqui ao lado vai saber que Domingos teve faro ao escalar a atriz, casada com o artista plástico René Machado e mãe de Clara, de 3 anos.
— Ela começou comigo aos 18 e já era um talento, porque o humor faz parte de sua corrente sanguínea — diz Domingos, que enxerga nela generosidade nas parcerias em cena.
Gustavo Machado, com quem a atriz vive um romance partido em “Razões para ser bonita”, apoia Domingos:
— Às vezes, estrelas impõem vontades. Ela, não. A Ingrid joga junto e cada dia de um jeito, porque está aberta ao que a gente propõe.
Foi a atriz, aliás, quem tomou a iniciativa de trazer a peça de LaBute ao Brasil, marcando sua volta aos palcos após o fenômeno teatral “Cócegas”, seu duo com Heloísa Périssé, visto por 5 milhões de pessoas em 11 anos. LaBute milita num humor abrasivo e vê o teatro como um meio de, nas palavras dele, “tratar velhas questões: o bem, o mal, o pecado” ou, no caso, a beleza.
— As pessoas perguntam mais sobre o meu cabelo do que sobre minha carreira. Por isso, para discutir a obsessão pela aparência, até porque sempre lutei contra estereótipos, eu precisava partir de um texto em que um casal se separa só porque ele a chama de “comum” — diz Ingrid, que se prepara para escrever um roteiro próprio, mais autoral. — Quando comecei no humor, ou você era a gostosona ou era a feia inteligente. No Chico Anysio, que foi meu mestre, houve um tempo em que você tinha a Monique Evans de biquíni de um lado e uma feiosa do outro. Isso está mudando.
LaBute era o trampolim para o que a atriz espera: textos mais sérios. Não por acaso ela estará no elenco do novo longa do diretor José Eduardo Belmonte, conhecido por filmes como o denso “Se nada mais der certo” (2008): “Mundo quebrado”, que entra em filmagem no início de 2013.
— Não quero fazer uma coisa só a vida inteira apenas para dar certo — diz Ingrid, filha do meio do casal Sônia Agel (advogada) e William Guimarães (jornalista, já falecido) e irmã de Astrid, 41 anos, e Sigrid, 38.
Embora rejeite rótulos, em tempos de neochanchada (expressão usada para designar filmes protagonizados por humoristas egressos da TV ou do teatro stand-up e sintonizados com a nova classe média), Ingrid é tida como “Miss Comédia” pelo mercado exibidor.
— Para a indústria cinematográfica, ela representa receita alta e sucesso — aposta Marcio Fraccaroli, diretor-geral da Paris Filmes, distribuidora que reserva 710 salas para “De pernas pro ar 2”, fazendo dele o maior lançamento do ano.
‘Chico Anysio Show’
Astros campeões de bilheteria veem nela um pé-quente:
— Ingrid é hoje um dos nomes que levam o público a ver um filme brasileiro. E isso é para poucos — diz o humorista blockbuster Bruno Mazzeo, que escreveu texto para a atriz quando ela integrava a trupe do “Chico Anysio Show”.
Há dois anos, quando o diretor Roberto Santucci a procurou com o projeto “De pernas por ar” (então chamado “Sex Delícia”), sobre uma empresária que vira dona de um empório de produtos eróticos, Mariza Leão pensou em Ingrid para o papel. Até ali, ela nunca havia protagonizado longas, apenas feito participações em filmes rodados por atores (como “Depois daquele baile”, de Roberto Bomtempo, e “Polaroides urbanas”, de Miguel Falabella) e diretores teatrais (“Um show de verão”, de Moacyr Góes).
— Desde “Cócegas” e “Sob nova direção” (humorístico estrelado por ela e Heloísa), Ingrid estava quicando na marca do pênalti. “De pernas pro ar” foi só um soprinho que revelou o óbvio — afirma Mariza.
Parceira de quase duas décadas, Heloísa Périssé vê o progresso da colega como consequência de sua perseverança:
— Na nossa relação de amor à primeira vista, a gente sempre brigou para ver quem trabalhava mais.
Para Ingrid, a maior conquista de seu trabalho é ver que um ator no Brasil pode ficar conhecido para além da TV:
— Sou reconhecida na rua por “De pernas por ar”, um filme, e “Cócegas”, uma peça, e não por novelas. Isso é fruto da verdade que tento imprimir.


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